BBS – O fim, o gigante atrapalhado e o aprendizado
Imagine um daqueles roteiros cinematográficos onde duas histórias correm em paralelo, mas em algum momento todos os personagens se encontram, o que muda radicalmente o destino de todos. Foi assim com a internet e com os BBS.
De um lado, havia uma rede global começando a ganhar forma entre universidades e entidades militares. A internet pré-anos 90 não era lá muito democrática, nem tinha descoberto – com o advento da Web – sua vocação comercial.
De outro, estavam os BBS. Como bem lembrou o leitor Antonio Feitosa, o formato BBS tanto era popular entre os SysOps, os administradores de rede amadores, como entre empresas, que disponibilizavam números para que seus clientes acessassem sistemas específicos. Na era pré-internet, para fazer as coisas via computador você não só tinha que se virar sem um Google como ainda precisava de uma pequena lista telefônica com os números do banco, do fabricante dos equipamentos (leia-se acessar por DDI !!!) e de onde mais você quisesse se conectar.
Se não pode vencê-lo…
Falei no post anterior sobre as primeiras redes entre BBS e sua conexão à internet via Alternex/Ibase (o primeiro provedor de acesso brasileiro). Esse embrião internético levou aqueles que eram os maiores BBS domésticos da época a se tornarem, desde 1994, a primeira leva de provedores privados de acesso à internet. E foram muitos BBS de peso que souberam saltar para a nova realidade que se impunha: CentroIn, Mandic, Unikey, entre vários. Outros, como o Online BBS do pioneiro Henrique Pechman, também leitor da coluna, se especializou em serviços de internet.
O crescimento da web veio a matar os BBS. Tudo acabava sendo mais rápido, mais prático, mais integrado e sedutor na rede. Uma coisa típica dos BBS, porém, a internet demorou a fazer: o senso de comunidade local. Os BBS amadores eram essencialmente regionais. Não só com pessoas de mesmo DDD (mesma cidade), mas pessoas de um mesmo prefixo – ou seja, de um mesmo bairro.
Quando os novos provedores, entre pequenos oriundos dos BBS e gigantes estabelecidos – UOL, Zaz/Terra etc – estavam se consolidando veio uma bomba. No final de 1999, a notícia de que a America Online (AOL) chegaria ao Brasil abalou o mercado. A AOL surgiu nos EUA na década de 80 como um BBS gigante, e nos anos 90 se tornou um dos primeiros – e o maior – provedor de internet por lá. Lembra do filme “Mensagem para você”, com Tom Hanks e Meg Ryan? Então: é basicamente um filme sobre a AOL.
O gigante tropeça
A AOL, com seu peso e fama, tinha tudo para sacudir o ainda frágil mercado brasileiro. Mas ela não contava com duas coisas: primeiro, que sua estratégia básica de entrada no mercado fosse dar terrivelmente errado. A ideia era simples. Inundar o país com CDs de instalação de seu navegador padrão. Só que o CD tinha problemas técnicos e era invasivo – o browser de seu PC se tornaria o da AOL e ponto. A rejeição foi imediata e um dos usos mais comuns para os CDs da AOL que se multiplicavam como Gremlins era enfeite de roda de bicicleta.
Outro fator foi o lançamento, poucos meses depois, dos primeiros provedores de acesso gratuito à internet. Estes sim chegaram como uma bomba atômica sobre os pequenos BBS que tinham se tornado provedores, e também sobre os grandes portais, que se viram obrigados a dar um jeito de entrar na moda grátis.
De volta ao mundo das pessoas, ainda mantenho contato com muitos jovens que começaram fuçando os códigos dessas mini-internets. O bacana é ver que muitos (muitos mesmo) atuam hoje com tecnologia, mídias digitais e afins, sempre bem-sucedidos em suas carreiras. Se não foi um negócio que tenha deixado qualquer um de nós ricos, sem dúvida a fantástica aventura dos BBS foi uma incrível escola de inovação e tecnologia. Pena de quem tem cada vez mais tudo simples, fácil e acessível. Um pouco de perrengue digital não faria mal às novas gerações conectadas.